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“3%” é uma série de ficção científica brasileira lançada em 2016 pela Netflix. Criada por Pedro Aguilera, foi a primeira série brasileira original da plataforma e rapidamente ganhou reconhecimento nacional e internacional por sua proposta ousada, roteiro instigante e crítica social profunda. Com uma estética futurista e temas pertinentes ao Brasil e ao mundo, 3% convida o espectador a refletir sobre meritocracia, desigualdade, ética e sobrevivência.

Enredo

A trama se passa em um futuro distópico onde a sociedade é dividida entre dois mundos contrastantes: o Continente, onde a maioria vive em extrema pobreza, e o Maralto, uma ilha utópica com acesso à tecnologia, segurança, saúde e bem-estar. No entanto, para viver no Maralto, os jovens de 20 anos têm apenas uma chance: passar pelo chamado Processo, uma série de provas psicológicas, físicas e morais. Apenas 3% dos candidatos são aprovados — os demais são descartados e voltam ao Continente, muitas vezes traumatizados ou destruídos.

A série acompanha o percurso de alguns jovens que enfrentam o Processo, entre eles:

  • Michele (Bianca Comparato) — uma jovem determinada com um passado misterioso e motivações ocultas.
  • Fernando (Michel Gomes) — um rapaz cadeirante extremamente inteligente, que quer provar seu valor.
  • Joana (Vaneza Oliveira) — uma sobrevivente das ruas com um espírito rebelde.
  • Rafael (Rodolfo Valente) — ambicioso, manipulador, mas com camadas profundas.
  • Ezequiel (João Miguel) — o coordenador do Processo, figura central cheia de contradições éticas.

Crítica à meritocracia

O principal tema abordado por 3% é a falácia da meritocracia. O Processo supostamente dá oportunidades iguais a todos, mas ignora completamente os contextos sociais, históricos e psicológicos dos candidatos. A série escancara o quanto o discurso de “quem merece vence” é falho, já que muitos são excluídos por fatores além do controle individual.

As provas, que incluem dilemas morais, disputas de liderança, manipulação e sacrifícios, acabam expondo o lado mais sombrio do ser humano, mostrando como a pressão por sucesso pode transformar até os mais bem-intencionados.

Ética e sobrevivência

Outro ponto central da narrativa é o conflito entre ética e sobrevivência. Para alcançar o Maralto, os candidatos muitas vezes precisam mentir, trair, manipular ou até matar. O Processo é apresentado como uma ferramenta de purificação, mas revela-se cruel, desumano e repleto de falhas.

Com o passar das temporadas, surgem movimentos de resistência, como a Causa, um grupo revolucionário que quer acabar com o Processo e unificar as sociedades. A protagonista Michele se envolve com essa organização, e o espectador é levado a refletir sobre as consequências da rebelião e da radicalização.

Desenvolvimento ao longo das temporadas

A série teve quatro temporadas, com desdobramentos cada vez mais complexos:

  • Temporada 1 (2016): Foco no Processo e nos personagens centrais. É onde se estabelece a tensão psicológica e a estrutura da sociedade.
  • Temporada 2 (2018): Explora o Maralto, seus líderes e as fragilidades da utopia. Também desenvolve o lado da resistência.
  • Temporada 3 (2019): Introduz uma nova proposta de alternativa social e conflitos internos entre os líderes.
  • Temporada 4 (2020): Conclusão da história, com confrontos finais, escolhas morais e sacrifícios importantes.

A série termina com uma proposta de mudança profunda, mas sem soluções fáceis — refletindo a complexidade dos sistemas de poder.

Estilo visual e produção

A estética de 3% é minimalista e eficaz. O contraste entre o cinza do Continente e o branco puro do Maralto simboliza a divisão social. A direção de arte cria ambientes que, mesmo futuristas, parecem familiares ao público brasileiro: prédios decadentes, estruturas improvisadas, ou espaços clean e assépticos.

A produção foi realizada quase integralmente no Brasil, com equipe local, o que valorizou o audiovisual nacional. A trilha sonora é sóbria, reforçando o clima tenso e introspectivo.

Elenco e atuações

O elenco de 3% é composto por atores em ascensão e outros já consolidados:

  • Bianca Comparato entrega uma Michele forte e vulnerável ao mesmo tempo.
  • Michel Gomes, conhecido por “Cidade de Deus”, oferece uma atuação sensível e potente.
  • Vaneza Oliveira é um destaque como Joana — intensa, carismática e com forte presença.
  • João Miguel, como Ezequiel, constrói um vilão complexo, capaz de despertar empatia.

As atuações são, em geral, realistas, com diálogos ágeis e expressões que reforçam o drama humano da história.

Recepção e impacto internacional

3% foi bem recebida pela crítica e público, especialmente por abrir as portas para produções brasileiras de gênero fora do país. Foi comparada a séries como The Hunger Games, Black Mirror e The 100, mas com identidade própria.

Nos Estados Unidos e Europa, o seriado despertou interesse pela sua abordagem sociopolítica e originalidade. No Brasil, reacendeu debates sobre desigualdade, meritocracia, privilégios e o papel do Estado na promoção de justiça social.

A série é considerada pioneira no streaming brasileiro e ajudou a consolidar a confiança da Netflix em investir em outras produções locais, como Coisa Mais Linda, Sintonia, Cidade Invisível e Bom Dia, Verônica.


Conclusão

3% é uma série que vai além do entretenimento. Ela instiga, provoca e desafia o espectador a repensar o mundo em que vive. Em uma narrativa envolvente e visualmente marcante, levanta questões éticas, sociais e políticas de forma acessível e profunda.

Para quem gosta de ficção científica com conteúdo crítico, personagens bem desenvolvidos e um toque nacional autêntico, 3% é uma experiência obrigatória.

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